domingo, 27 de março de 2022

RAZÃO DOS APELOS

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RAZÃO DOS APELOS

Pelo que, sendo chamado, vim sem contradizer.

Pergunto, pois: por que razão mandastes chamar-me?

Pedro (ATOS, 10:29).

A pergunta de Pedro ao centurião Cornélio é traço de grande significação nos atos apostólicos.

O funcionário romano era conhecido por suas tradições de homem caridoso e reto, invocava a presença do discípulo de Jesus atendendo a elevadas razões de ordem moral, após generoso alvitre de um emissário do Céu e, contudo, atingindo-lhe o círculo doméstico, o ex-pescador de Cafarnaum interroga, sensato:

– “Por que razão mandastes chamar-me?”

Simão precisava conhecer as finalidades de semelhante exigência, tanto quanto o servidor vigilante necessita saber onde pisa e com que fim é convocado aos campos alheios.

Esse quadro expressivo sugere muitas considerações aos novos aprendizes do Evangelho.

Muita gente, por ouvir referências a esse ou àquele Espírito elevado costuma invocar-lhe a presença nas reuniões doutrinárias.

A resolução, porém, é intempestiva e desarrazoada. Por que reclamar a companhia que não merecemos?

Não se pode afirmar que o impulso se filie à leviandade, entretanto, precisamos encarecer a importância das finalidades em jogo.

Imaginai-vos chamando Simão Pedro a determinado círculo de oração e figuremos a aquiescência do venerável apóstolo ao apelo. Naturalmente, sereis obrigados a expor ao grande emissário celestial os motivos da requisição. E, pautando no bom senso as nossas atitudes mentais, indaguemos de nós mesmos se possuímos bastante elevação para ver, ouvir e compreender-lhe o espírito glorioso. Quem de nós responderá afirmativamente? Teremos, assim, suficiente audácia de invocar o sublime Cefas, tão somente para ouvi-lo falar?

NOSSA REFLEXÃO

Emmanuel nos chama a atenção para a justificativa de chamarmos a quem é superior a nós. É fato que devemos ocupar os mentores para nos ensinar algo que n os preocupa e não somente para assistir uma preleção. Quem gosta de falar, relevando falta de humildade, são aquelas  pessoas que fazem de sua vida uma série de falações, que se acham detentoras de conhecimentos capazes de as tornarem uma pessoa influenciadora, procuradas para palestras presenciais ou virtuais. Nesta era, o que conta é o quanto a pessoa é seguida digitalmente, que a torna um influenciadora digital (influencer).

Isto nos faz pensar sobre o problema da evocação. Quando devemos fazer e qual o objetivo de se fazê-la? É estudo ou um passatempo?

Nos início das comunicações ostensivas denominadas Mesas Girantes, a evocações eram mais motivadas pela curiosidade do que pela seriedade. A. Kardec quando foi convidado a participar de uma, foi muito cético, mas respeitoso. E nas comunicações viu algo de muito sério nos fenômenos.[1]

Um dos resultados da sua pesquisa foi a produção de o Livro dos Médiuns (1861). Sobre a evocação, A. Kardec nos esclarece:

Todos os Espíritos, qualquer que seja o grau em que se encontrem na escala espiritual, podem ser evocados: assim os bons, como os maus, tanto os que deixaram a vida de pouco, como os que viveram nas épocas mais remotas, os que foram homens ilustres, como os mais obscuros, os nossos parentes e amigos, como os que nos são indiferentes. Isto, porém, não quer dizer que eles sempre queiram ou possam responder ao nosso chamado. Independente da própria vontade, ou da permissão, que lhes pode ser recusada por uma potência superior, é possível se achem impedidos de o fazer, por motivos que nem sempre nos é dado conhecer

Entre as causas que podem impedir a manifestação de um Espírito, umas lhe são pessoais e outras, estranhas. Entre as primeiras, devem colocar-se as ocupações ou as missões que esteja desempenhando e das quais não pode afastar-se, para ceder aos nossos desejos. (Grifos nossos)[2]

 

Então, é importante que estejamos imbuídos de muita boa vontade de aprender ou necessitados de uma orientação que pode nos ajudar a ajudar a alguém.

Que saibamos apresentar um motivo útil para evocar um ser elevado para nos instruir.

Que Deus nos ajude.

Domício.


[1] Na Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita de O Livro dos Espíritos, Item IV, A. Kardec nos disserta sobre a sua experiência com as manifestações das mesas girantes: “Se os fenômenos, com que nos estamos ocupando, houvessem ficado restritos ao movimento dos objetos, teriam permanecido, como dissemos, no domínio das ciências físicas. Assim, entretanto, não sucedeu: estava-lhes reservado colocar-nos na pista de fatos de ordem singular. Acreditaram haver descoberto, não sabemos pela iniciativa de quem, que a impulsão dada aos objetos não era apenas o resultado de uma força mecânica cega; que havia nesse movimento a intervenção de uma causa inteligente. Uma vez aberto, esse caminho conduziu a um campo totalmente novo de observações”.
[2]
Vide em O Livro dos Médiuns, Segunda Parte, Das manifestações Espíritas, Cap. XXV, Itens 274 a 279.

domingo, 20 de março de 2022

EM CADEIAS

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EM CADEIAS

Pelo qual sou embaixador em cadeias; para que possa falar dele livremente, como me convém falar.

Paulo (EFÉSIOS, 6:20).

Observamos nesta passagem o apóstolo dos gentios numa afirmativa que parece contraditória, à primeira vista.

Paulo alega a condição de emissário em cadeias e, simultaneamente, declara que isto ocorre para que possa servir ao Evangelho, livremente, quanto convinha.

O grande trabalhador dirigia-se aos companheiros de Éfeso, referindo-se à sua angustiosa situação de prisioneiro das autoridades romanas; entretanto, por isto mesmo, em vista do difícil testemunho, trazia o espírito mais livre para o serviço que lhe competia realizar.

O quadro é significativo para quantos pretendem a independência econômico­-financeira ou demasiada liberdade no mundo, a fim de exemplificarem os ensinamentos evangélicos.

Há muita gente que declara aguardar os dias da abundância material e as facilidades terrestres para atenderem ao idealismo cristão. Isto, contudo, é contrassenso. O serviço de Jesus se destina a todo lugar.

Paulo, entre cadeias, se sentia mais livre na pregação da verdade. Naturalmente, nem todos os discípulos estarão atravessando esses montes culminantes do testemunho. Todos, porém, sem distinção, trazem consigo as santas algemas das obrigações diárias no lar, no trabalho comum, na rotina das horas, no centro da sociedade e da família.

Ninguém, portanto, tente quebrar as cadeias em que se encontra, na mentirosa suposição de que se candidatará a melhor posto nas oficinas do Cristo.

Somente o dever bem cumprido nos confere acesso à legítima liberdade.

NOSSA REFLEXÃO

Em qualquer lugar e situação em que estivermos podemos servir a causa do Mestre, tornando-a nossa.

Estando preso em cadeias própria do mundo, podemos, sem se comprometer demasiadamente com elas, servir a um propósito maior que é a nossa libertação espiritual. Ou seja, devemos dar “[...] a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mateus, 22:15 a 22; Marcos, 12:13 a 17). Isto significa, conforme, A. Kardec, “[...] que a cada um seja dado o que lhe é devido” [1].

No cumprimento do dever social ou profissional, devemos no posicionar, como cristãos comprometidos com a verdade e a liberdade social, em que todos e todas devem ser respeitados (as) em suas necessidades básicas, sem faltar com a Lei de Amor. Eis o grande desafio. Sermos cristãos e políticos ao mesmo tempo.

De qualquer modo, não podemos nos comprometer com o mundo falido e cheio de armadilhas, como o próprio Jesus foi exposto, como nesta situação citada acima. E nem esperar o tempo bom para sermos dignos de sermos chamados de cristãos. Conforme Emmanuel, nesta mensagem, ora refletida, “Ninguém, portanto, tente quebrar as cadeias em que se encontra, na mentirosa suposição de que se candidatará a melhor posto nas oficinas do Cristo. Somente o dever bem cumprido nos confere acesso à legítima liberdade”.

Que Deus nos ajude.

Domício.


[1] Vide interpretação de A. Kardec, na íntegra, em O Evangelho Segundo o Espíritismo, Cap. XI, Item 6.

domingo, 13 de março de 2022

PERIGOS SUTIS

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PERIGOS SUTIS

Não vos façais, pois, idólatras.

Paulo (I CORÍNTIOS, 10:7).

A recomendação de Paulo aos Coríntios deve ser lembrada e aplicada em qualquer tempo, nos serviços de ascensão religiosa do mundo.

É indispensável evitar a idolatria em todas as circunstâncias. Suas manifestações sempre representaram sérios perigos para a vida espiritual.

As crenças antigas permanecem repletas de cultos exteriores e de ídolos mortos.

O Consolador, enviado ao mundo, na venerável missão espiritista, vigiará contra esse venenoso processo de paralisia da alma.

Aqui e acolá, surgem pruridos de adoração que se faz imprescindível combater. Não mais imagens dos círculos humanos, nem instrumentos físicos supostamente santificados para cerimônias convencionais, mas entidades amigas e médiuns terrenos que a inconsciência alheia vai entronizando, inadvertidamente, no altar frágil de honrarias fantasiosas. É necessário reconhecer que aí temos um perigo sutil, através do qual inúmeros trabalhadores têm resvalado para o despenhadeiro da inutilidade.

As homenagens inoportunas costumam perverter os médiuns dedicados e inexperientes, além de criarem certa atmosfera de incompreensão que impede a exteriorização espontânea dos verdadeiros amigos do bem, no plano espiritual.

Ninguém se esqueça da condição de aperfeiçoamento relativo dos mensageiros desencarnados que se comunicam e do quadro de necessidades imediatas da vida dos medianeiros humanos.

Combatamos os ídolos falsos que ameaçam o Espiritismo cristão. Utilize cada discípulo os amplos recursos da lei de cooperação, atire-se ao esforço próprio com sincero devotamento à tarefa e lembremo-nos todos de que, no apostolado do Mestre Divino, o amor e a fidelidade a Deus constituíram o tema central.

NOSSA REFLEXÃO

Esta mensagem pode ser contextualizada no âmbito da adoração à lembrança de ilustres trabalhadores espíritas que já nos deixaram ou à imagem mental de Espíritos que coordenam uma reunião mediúnica em que se denominam esse ou aquele representante da seara do Mestre em tempos remotos. Esses apóstolos do bem devem ter a nossa gratidão, mas não adoração.

Quando do desconhecimento do ser, na História da cristandade, que colabora com o trabalho da casa espírita, é sempre bom considerarmos que todos nós somos cooperadores, quando queremos, da seara do Cristo, mas não significa que somos elevados a títulos de muitas considerações morais. Emmanuel, nessa mensagem que refletimos, nos alerta sobre isso, se tratando dos irmãos que colaboram no plano espiritual: “Ninguém se esqueça da condição de aperfeiçoamento relativo dos mensageiros desencarnados que se comunicam e do quadro de necessidades imediatas da vida dos medianeiros humanos”.

Perigo maior podemos ter: os falsos profetas da espiritualidade. Sobre isto, A. Kardec nos orienta:

O Espiritismo revela outra categoria bem mais perigosa de falsos cristos e de falsos profetas, que se encontram, não entre os homens, mas entre os desencarnados: a dos Espíritos enganadores, hipócritas, orgulhosos e pseudossábios, que passaram da Terra para a erraticidade e tomam nomes venerados para, sob a máscara de que se cobrem, facilitarem a aceitação das mais singulares e absurdas ideias.[1]

Isto se dá, também entre os encarnados, em que eloquentes pregadores arrebanham multidões explorando os fiéis em suas necessidades. Aqui temos que refletir sobre a relação entre falas e atos. Eis o crivo que o Espírito Luís nos aponta:

É assim, meus irmãos, que deveis julgar; são as obras que deveis examinar. Se os que se dizem investidos de poder divino revelam sinais de uma missão de natureza elevada, isto é, se possuem no mais alto grau as virtudes cristãs e eternas: a caridade, o amor, a indulgência, a bondade que concilia os corações; se, em apoio das palavras, apresentam os atos, podereis então dizer: Estes são realmente enviados de Deus. Desconfiai, porém, das palavras melífluas, desconfiai dos escribas e dos fariseus que oram nas praças públicas, vestidos de longas túnicas. Desconfiai dos que pretendem ter o monopólio da verdade.[2]

Desse modo, toda pessoa ou Espírito, seja encarnado ou desencarnado, deve ser acompanhado com relação aos seus atos, se eles são ilustres palestrantes ou manifestantes nas hostes mediúnicas das casas espíritas, não com espírito de desconfiança. Como disse o Discípulo João: “Meus bem-amados, não creais em qualquer Espírito; experimentai se os Espíritos são de Deus, porquanto muitos falsos profetas se têm levantado no mundo”. (JOÃO, 1a Epístola, 4:1.)[3]

Assim, que sejamos cuidadosos em não seguir piamente esse ou aquele manifestante de palavras fáceis, principalmente se somos concordantes com suas condutas. O estudo vale tanto para reconhecermos os falsos profetas nos outros ou outras, como em nós mesmos (as).

Que Deus nos ajude.

Domício.


[1] Vide em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XXI, Item 7.
[2] Vide mensagem na íntegra em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. Cap. XXI, item 8.
[3]
Vide em O Livro dos Médiuns, 2a Parte, Cap. XXIV e seguintes, Sobre a maneira de se distinguirem os Espíritos.

domingo, 6 de março de 2022

SOCORRE A TI MESMO

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SOCORRE A TI MESMO

Pregando o Evangelho do reino e curando todas as enfermidades.

Mateus (9:35).

Cura a catarata e a conjuntivite, mas corrige a visão espiritual de teus olhos.

Defende-te contra a surdez, entretanto, retifica o teu modo de registrar as vozes e solicitações variadas que te procuram.

Medica a arritmia e a dispneia, contudo, não entregues o coração à impulsividade arrasadora.

Combate a neurastenia e o esgotamento, no entanto, cuida de reajustar as emoções e tendências.

Persegue a gastralgia, mas educa teus apetites à mesa.

Melhora as condições do sangue, todavia, não o sobrecarregues com os resíduos de prazeres inferiores.

Guerreia a hepatite, entretanto, livra o fígado dos excessos em que te comprazes.

Remove os perigos da uremia, contudo, não sufoques os rins com os venenos de taças brilhantes.

Desloca o reumatismo dos membros, reparando, porém, o que fazes com teus pés, braços e mãos.

Sana os desacertos cerebrais que te ameaçam, todavia, aprende a guardar a mente no idealismo superior e nos atos nobres.

Consagra-te à própria cura, mas não esqueças a pregação do reino divino aos teus órgãos.

Eles são vivos e educáveis. Sem que teu pensamento se purifique e sem que a tua vontade comande o barco do organismo para o bem, a intervenção dos remédios humanos não passará de medida em trânsito para a inutilidade.

NOSSA REFLEXÃO

Esta mensagem, no nosso entendimento, segue um tema central que abrange a mensagem anterior deste livro e tem relação com outras mensagens de Emmanuel no livro Fonte Viva: Equilíbrio espiritual e reforma íntima.[1]

Emmanuel nos faz refletir sobre a importância da prevenção às doenças do corpo. Chama-nos a atenção para o equilíbrio de nossos atos e pensamentos que preservam a sua saúde.

Há uma estreita relação entre o Espírito e o Corpo. À questão de nº 714[2] de O Livro dos Espíritos, os Espíritos Superiores responderam à A. Kardec:

Pobre criatura! mais digna é de lástima que de inveja, pois bem perto está da morte!

a)    Perto da morte física, ou da morte moral?

“De ambas.”

O homem, que procura nos excessos de todo gênero o requinte do gozo, coloca-se abaixo do bruto, pois que este sabe deter-se, quando satisfeita a sua necessidade. Abdica da razão que Deus lhe deu por guia e quanto maiores forem seus excessos, tanto maior preponderância confere ele à sua natureza animal sobre a sua natureza espiritual. As doenças, as enfermidades e, ainda, a morte, que resultam do abuso, são, ao mesmo tempo, o castigo à transgressão da Lei de Deus.

 

Somos, então, chamados a fugir dos excessos das sensações que podemos obter no corpo a partir das necessidades básicas e manutenção da vida. Tudo em excesso nos faz mal.

Então, busquemos a cura do corpo, mas nos consagremos a mudar nossos pensamentos e atos que o prejudicam.

Como Emmanuel nos diz, nesta mensagem: “Consagra-te à própria cura, mas não esqueças a pregação do Reino Divino aos teus órgãos”.

Que Deus nos ajude e tenhamos vontade firme de nos modificarmos.

Domício.



[1] Vide em Vigiemos e Oremos e Estás doente?
[2]
LE, Questão 714: Que se deve pensar do homem que procura nos excessos de todo gênero o requinte dos gozos?